A ictiofauna da bacia do rio Doce após o rompimento da barragem de rejeito da Samarco, com foco em segurança alimentar
Em 5 de Novembro de 2015, a bacia do Rio Doce foi atingida pelo rompimento de uma barragem das mineradoras Samarco/Vale/BHP (Barragem de Fundão) no município de Mariana em Minas Gerais, liberando entre 42 e 62 milhões de toneladas de rejeito de minério de ferro (GFT, 2016). O tsunami de rejeito arrastou uma grande massa de matéria vegetal, percorrendo 663 km da calha do rio e de alguns tributários, deixando 19 vítimas, 600 pessoas desabrigadas e milhares de pessoas sem água potável. Dentre vários distúrbios, o rejeito de minério provocou uma grande mortandade de peixes. Aproximadamente um ano e meio após a passagem do rejeito, a empresa Econservation realizou estudos sobre peixes ao longo do trajeto do minério. Os dados obtidos ainda fornecem informação extremamente valiosa sobre um ecossistema muito pouco conhecido.
Em 2018, a Fundação Renova assinou um convênio com a intercessão da SIF, visando dar continuidade aos estudos da Econservation, já que os peixes representam um grupo importante para a economia de subsistência dos ribeirinhos. Esse convênio inicial entra no seu terceiro ano e visa vários objetivos: qual o grau de ameaça atual das espécies nativas, qual o processo de repovoamento da fauna de peixes, qual a saúde dos peixes e qual a possibilidade de os peixes serem reintegrados como item alimentar. Os resultados indicam um panorama complexo, já que as ameaças às espécies nativas em parte precedem o derramamento do rejeito e algumas delas podem agir de forma complexa, associadas à perda de conectividade do rio.
O processo de repovoamento começou logo depois do retorno das condições mínimas de sobrevivência da biodiversidade aquática, mas o grau de tolerância de cada espécie a esse novo ambiente e as interações entre elas, precisa ainda ser mais explorado. Da mesma forma, a presença de metais nos peixes ainda carece de tamanhos amostrais maiores e comparações mais completas entre os ambientes que não foram impactados pelo rejeito, com a fauna que hoje é encontrada no Rio Doce. Um remanescente importante da fauna nativa ainda existe nos seus tributários e deles depende, com certeza, a capacidade de reabilitação completa do ecossistema do Rio Doce.
O projeto é coordenado pelo Professor do Departamento de Biologia Animal, Jorge Abdala Dergam dos Santos. O Professor deu o seguinte depoimento: “A oportunidade de contribuir com estudos específicos para subsidiar grupos multidisciplinares que apontem para soluções no mundo real, não ocorre com frequência na vida acadêmica. Os desafios de desenvolver um trabalho de caráter colaborativo, numa extensão tão ampla como a bacia do Rio Doce são enormes e exigem perseverança, disciplina e criatividade. Quanto mais trabalhamos, mais temos consciência da demanda de conhecimento teórico e vivência com as pessoas e as instituições envolvidas neste processo. Por cima de tudo, temos certeza que estes primeiros passos darão o alicerce necessário para o trabalho de muitos pesquisadores no futuro.”
Professor Jorge Dergam
Coordenador do Projeto