Espécies de plantas exóticas invasoras: uma ameaça ao sucesso da restauração ecológica

 

A invasão biológica consiste em uma das maiores ameaças a biodiversidade, promovendo prejuízos ambientais, econômicos e sociais. Espécies exóticas invasoras comprometem a estrutura, dinâmica e funcionalidade de ambientes terrestres, de água doce e marinhos, trazendo impactos negativos aos serviços ecossistêmicos prestados. Adicionalmente, por se tratar de um processo complexo, as intervenções em ambientes invadidos estão comumente atreladas a custos elevados com mão-de-obra e insumos.

Na restauração ecológica, o objetivo central que norteia as atividades é aproximar ao máximo o ambiente restaurado a sua condição original. Nesse contexto, um grande desafio em muitos locais é combater a presença de espécies de plantas exóticas invasoras, que competem fortemente com as espécies de plantas nativas por luz, água e nutrientes. Assim, os custos da restauração ficam ainda maiores, devido a necessidade constante de corrigir a trajetória da área em restauração no combate a presença das espécies exóticas invasoras.

 

Toda espécie exótica é invasora?

Não. Primeiramente, vamos entender quando uma espécie pode ser classificada como exótica. As espécies exóticas são definidas como espécies nativas de um outro habitat que são introduzidas, de forma intencional ou não, em determinados locais onde não são encontradas naturalmente. Nesse sentido, uma espécie pode ser considerada exótica mesmo dentro do seu país de origem, caso esteja fora da sua região de ocorrência natural. Vale lembrar que a introdução de espécies exóticas trata-se de uma atividade historicamente conduzida pela humanidade. No Brasil, podemos destacar a introdução de espécies de plantas exóticas na agricultura, silvicultura, arborização urbana e paisagismo.

Para que uma espécie vegetal exótica tenha caráter invasor, é necessário que seus indivíduos sejam capazes de romper uma série de barreiras limitantes para sua disseminação, o que garante complexidade ao processo de invasão. Confira, na sequência, as principais barreiras conforme a publicação de Richardson et al. (2000) – Naturalization and invasion of alien plants: concepts and definitions.

  1. Geográfica: primeiramente, a espécie precisa ser introduzida em um novo habitat onde não ocorre naturalmente. Isso poderá ser de forma intencional, para fins comerciais ou paisagísticos, ou não intencional, como sementes e propágulos presos em implementos agrícolas, por exemplo.
  2. Ambiental (local): na sequência, a espécie exótica precisa sobreviver no local onde foi introduzida, rompendo as barreiras bióticas e abióticas impostas pelo novo ambiente. Por não ser nativa daquele local, é comum que a espécie exótica não enfrente problemas com inimigos naturais. Apesar disso, é importante destacar que o novo ambiente precisa fornecer condições para que a espécie sobreviva naquele local.
  3. Reprodutiva: para se estabelecerem, os indivíduos da espécie exótica precisam se reproduzir, seja de forma sexuada, com a produção de sementes, ou assexuada, a partir de propágulos vegetativos como rizomas, estolões, tubérculos e bulbos.
  4. Dispersão: após se estabelecerem, os indivíduos da espécie exótica precisam conseguir dispersar suas sementes e/ou propágulos vegetativos.
  5. Ambiental (áreas perturbadas): posteriormente, a espécie exótica deve ser capaz de invadir áreas que apresentem algum nível de degradação que, como consequência, são mais suscetíveis ao processo de invasão. Dessa forma, a partir desse ponto, a espécie exótica já pode ser considerada invasora.
  6. Ambiental (áreas não perturbadas): espécies exóticas com alto poder de invasão tem potencial, inclusive, de invadir ecossistemas saudáveis, desde que apresentem condições favoráveis à sobrevivência e estabelecimento das invasoras.

 

Esquema das principais barreiras limitantes (AF) para a disseminação das espécies de plantas introduzidas. As setas de a até f indicam os caminhos percorridos pelas espécies para atingir os diferentes estados, desde introduzida até invasora. Fonte: adaptado de Richardson et al. (2000).

 

Como saber se uma espécie exótica se comportará como invasora?

Muitas espécies exóticas já tem seu potencial de invasão conhecido em diferentes ecossistemas ao redor do mundo. No Brasil, não é diferente. Podemos citar a invasão da palmeira australiana (Archontophoenix cunninghamiana) em sub-bosques de Florestas Estacionais Semideciduais, a invasão de braquiária (Urochloa spp.) em campos limpos do Cerrado, a invasão de leucena (Leucaena leucocephala) em áreas ciliares, dentre muitos outros exemplos registrados na literatura. Porém, na ausência de informações para uma espécie e/ou região específica, trazemos algumas dicas.

Sobre a espécie (poder de invasão): as espécies exóticas invasoras comumente são dotadas de características que favorecem o rompimento das barreiras já descritas anteriormente. Dentre elas, podemos destacar: elevada variabilidade genética e plasticidade fenotípica; altas taxas de reprodução; produção de sementes e/ou propágulos vegetativos em elevada quantidade; altas taxas de dispersão; e formação de banco de sementes persistente. Essas características contribuem com o poder de invasão da espécie exótica, ou seja, sua capacidade de invadir e prejudicar seu novo habitat.

Sobre o novo habitat (suscetibilidade a invasão): para que a invasão ocorra, é necessário que o ecossistema forneça condições para que os indivíduos da espécie invasora sobrevivam, se estabeleçam e desenvolvam uma população abundante de descendentes reprodutivos. Assim, além dos aspectos intrínsecos a espécie exótica, é importante avaliar se o novo ambiente apresenta similaridade com o habitat de origem da invasora. Outro ponto importante a ser considerado se refere ao estado de conservação do ecossistema. Pequenos fragmentos de vegetação nativa altamente afetados pelo efeito de borda, por exemplo, estão mais vulneráveis a invasão biológica do que fragmentos com áreas extensas. A matriz da paisagem também interfere. Paisagens compostas predominantemente por centros urbanos ou áreas de pastagem composta por gramíneas invasoras, favorecem o processo de invasão.

 

Quais as implicações na restauração ecológica?

A presença de espécies de plantas invasoras nas áreas em restauração pode inibir o processo de sucessão secundária e, como consequência, impedir o atingimento do sucesso da restauração ecológica. Ao longo do desenvolvimento das atividades de restauração, muitos projetos foram comprometidos pelo uso de mudas de espécies exóticas invasoras, justamente pelo fato de garantirem rápido recobrimento da área. Nesse sentido, podemos exemplificar o uso das espécies exóticas Leucaena leucocephala e Acacia mangium, que eram indicadas para recuperação de solos, mas prejudicavam o desenvolvimento das espécies nativas. Dessa forma, é fundamental elaborar a lista de plantio ou semeadura com foco nas espécies nativas regionais, prevenindo uma possível via de invasão.

Entretanto, vale lembrar que muitas áreas destinadas a restauração já apresentam algum nível de invasão biológica, seja por gramíneas, arbustos, árvores, dentre outras formas de vida. A tomada de decisão quanto ao método de controle adotado dependerá de diversos fatores, destacando-se aqueles relacionados: a espécie invasora; ao ecossistema afetado; ao local e a paisagem onde a área está inserida; aos dispositivos legais; além dos custos e recursos disponíveis. Após as ações de controle, a etapa de monitoramento é fundamental para garantir se os impactos negativos da invasão estão sendo mitigados e se existe a necessidade de novas intervenções.

 

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