Gramíneas exóticas na restauração

Tem se tornado cada vez mais comum associar de forma antagonista o termo “restauração” à palavra “braquiária”. A ligação entre estas duas palavras tem origem na frequente presença de gramíneas exóticas em áreas destinadas à restauração florestal. Neste caso, estas espécies devem ser eliminadas do sistema, pois podem causar uma estagnação ou retrocesso no processo de restauração através de uma relação ecologicamente complexa, sendo amplamente estudada no contexto da invasão biológica.

Espécies invasoras são espécies exóticas (não nativas) que se proliferam de maneira descontrolada, ameaçando o equilíbrio de um ecossistema. Assim, este termo se estende aos mais variados grupos de espécies, incluindo plantas e animais. Contudo, algumas gramíneas do gênero Urochloa, popularmente conhecidas como braquiárias, e outras como o capim-gordura (Melinis minutiflora) e o capim-colonião (Panicum maximum), tem um impacto muito direto na restauração, pois é uma luta travada desde o início do processo e que interfere diretamente na formação da estrutura florestal.

Área em restauração com forte presença de braquiária.
Fonte: Acervo pessoal

Cabe destacar que nem sempre a presença de braquiária numa área em restauração é sinônimo de invasão, pois em muitos casos a restauração é realizada justamente em área de pasto em que a gramínea foi plantada no passado, ou seja, não invadiu a área, mas já estava lá por ação antrópica direta e proposital. Contudo, é necessário realizar seu controle para garantir o avanço da sucessão ecológica. Assim, avaliar a qualidade do controle da matocompetição na implantação e durante a manutenção é um ponto chave, já que a competição com as gramíneas reflete diretamente no desenvolvimento da floresta.

Mas por que essas espécies causam tantos problemas?

As espécies de gramíneas citadas acima foram trazidas da África para o Brasil com o objetivo de formar pastos para alimentação de gado, tendo em vista que elas servem de alimento para animais de grande porte na savana africana.

Como esperado, as características climáticas do Brasil se revelaram altamente favoráveis para o desenvolvimento destas espécies, que apresentam grande produção de biomassa e capacidade reprodutiva em condições de alta temperatura e precipitação, além de resistência a períodos secos.

Embora sejam características desejáveis para espécies forrageiras, o difícil controle em locais onde sua presença é indesejada e o elevado potencial invasor as tornaram uma ameaça para os ecossistemas nativos. Isto porque é muito comum encontrar essas espécies estabelecidas em Áreas de Preservação Permanente, Reservas Legais ou causando problemas em Unidades de Conservação, devido à existência atual ou prévia de atividade pecuária ou até mesmo devido a influência das pastagens do entorno.

Como tem sido feito o controle?

Baseando-se no conhecimento da proteção de culturas, existem cinco abordagens a serem consideradas:

Abordagens na proteção de culturas. Fonte: Adaptado do livro Physical control methods in plant protection, dos editores Charles Vincent, Bernhard Panneton e Francis Fleurat-Lessard

De modo geral, o controle pode ser químico, físico ou biológico. Embora o controle químico seja amplamente utilizado para muitas culturas agrícolas, seu uso tem sido restrito na restauração florestal.

Assim, o controle físico mecânico tem prevalecido, através do coroamento das mudas. Contudo, este é um método de baixo rendimento operacional e elevado custo, já que exige a manutenção constante nos primeiros anos. Além disso, a mera capina em torno das mudas tem uma eficiência baixa, pois o dano causado à gramínea é relativamente pequeno e em poucas semanas a braquiária já está em condições de competir com as espécies nativas.

Capina elétrica na restauração florestal: uma tecnologia a ser testada

Outras formas de controle físico têm sido pouco exploradas, mas essas abordagens surgem como alternativas interessantes para o controle de espécies exóticas respeitando as crescentes restrições das agências reguladoras ao uso de herbicidas em ambientes urbanos e agrícolas.

Uma das estratégias dentro deste tipo de controle é o uso de correntes elétricas. O objetivo é disparar uma descarga elétrica ao entrar em contato com o alvo, sendo transportada por toda a extensão das plantas e dissipada pelo solo. A morte das plantas é causada principalmente pelo aumento da temperatura e vaporização de água e outros líquidos voláteis. Isso resulta em um acúmulo de pressão dentro das células e subsequente ruptura das membranas celulares.

Já existem produtos voltados para esse tipo de controle no mercado, a exemplo das soluções desenvolvidas pela empresa Zasso. O Electroherb™ é a tecnologia por trás da capina elétrica, sendo uma solução sistêmica não seletiva que pode ser aplicada em área total ou em linhas para agricultura (pomares, silvicultura, plantações de café, vinhedos, entre outros), áreas urbanas (vias municipais e rodovias), paisagismo (jardins, aplicações pontuais) e ferrovias. A tecnologia já está sendo aplicada para controle de plantas indesejáveis em áreas urbanas pela Capina Minas.

Conforme a figura que mostra os diferentes equipamentos, existe um produto mais adequado para cada finalidade. O IZI é uma opção portátil, em que o equipamento é transportado manualmente pelo operador e utilizado para aplicações pontuais. O THOR é indicado para aplicações urbanas, em rodovias e na agricultura. O XPOWER trabalha com maior potência, danificando quaisquer plantas que entram em contato direto com o sistema aplicador.

Quando o alvo encosta no polo positivo (que fica alguns centímetros acima do solo), uma corrente elétrica é disparada e passa pelas folhas, caules e raízes. Uma vantagem deste método é causar um maior dano em profundidade, de forma similar ao controle químico, trazendo uma eficiência superior as demais métodos.

 

Comparação da profundidade de efeito de diferentes métodos de controle de plantas daninhas. Fonte: Zasso

Embora esta tecnologia tenha sido desenvolvida com foco em outras áreas, ela pode ser testada para atender as demandas operacionais da restauração florestal. Pontos a serem avaliados incluem a eficiência no controle de plantas indesejáveis, uso em área total e entre linhas, rendimento operacional, custo, entre outros. Além disso, também é importante avaliar quais os eventuais impactos que este tipo de aplicação poda causar, como distúrbios na microbiota e microfauna do solo.

 

Luiz Henrique Cosimo

Engenheiro Florestal

Coordenador Operacional GT Restauração

 

 

Sebastião Venâncio Martins

Prof. Titular DEF/UFV 

Líder Técnico GT Restauração