A era da transição energética e o segmento de carvão vegetal

As árvores plantadas representam, com posição de destaque, o desenvolvimento de uma economia de baixo carbono. Através da capacidade em estocar carbono, as florestas absorvem o CO2 da atmosfera, imobilizam o carbono na forma de biomassa, liberando oxigênio para atmosfera. Esta dinâmica natural é afetada em grande parte pela cobertura vegetal no mundo, ressaltando a importância da floresta. O Brasil é um país florestal, com área estimada de 488,1 milhões de hectares composto por florestas naturais e 9,84 milhões de hectares com florestas plantadas, totalizando, aproximadamente, 187,23 bilhões de toneladas de CO2 equivalente estocados (SFB, 2019).

O setor de florestas plantadas oferece uma grande variedade de produtos, aproximadamente, 5 mil itens distribuídos nos segmentos de madeira serrada, papel, celulose, pisos e painéis de madeira e carvão vegetal (IBÁ, 2019). O carvão vegetal é um dos principais produtos florestais utilizado como fonte de energia e em maior quantidade pelo setor siderúrgico e metalúrgico como termoredutor. Somente em 2018 foram produzidos 5,7 milhões de toneladas deste insumo e consumidos pelo setor siderúrgico e metalúrgico o correspondente à 83% da produção, totalizando 4,74 milhões de toneladas (EPE, 2019).

No cenário de transformação da matriz energética mundial através da maior participação das fontes renováveis, no Brasil, o carvão vegetal terá papel importante nesta transição. Segundo SINDIFER (2020) o Brasil produziu 30,7 milhões de toneladas de ferro-gusa em 2019, sendo 22,9% utilizando o carvão vegetal como termoredutor, e o restante utilizando coque. Em relação ao setor de ferroligas, segundo MME (2019), foram produzidas aproximadamente 575.371 toneladas de ferroligas e silício metálico em 2018, sendo 85,5% utilizando carvão vegetal como bioredutor. Neste sentido, para o aumento de 1% na produção de ferro-gusa e ferroligas, estima-se o aumento de 176.538,4 e 5.069,71 toneladas no consumo de carvão vegetal por ano.

Em termos de consumo de madeira para suprir esta demanda, pode-se simular cenários que demonstrem o impacto na cadeia produtiva de carvão vegetal e madeira. Considerando a densidade média da madeira de eucalipto igual a 500 kg/m3, e supondo cenários com processo de conversão altamente tecnificado (RG = 30%) ou pouco tecnificado e subjetivo (RG = 26%) (CGEE, 2015); para o aumento de 1% na produção de ferro-gusa, estima-se a demanda de, aproximadamente, 1,18 e 1,38 milhões de m3 de madeira, respectivamente, para suprir este aumento. Em termos de área plantada, considerando a produtividade das florestas de eucalipto igual a 36 m3/ha.ano (IBÁ, 2019) e idade de corte igual a 7 anos, para suprir este aumento seria necessário 5.756 ou 6.642 hectares de floresta anualmente, considerando os mesmos cenários.

Quanto ao setor de ferroligas e silício metálico, ao considerarmos os mesmos inputs para produção de ferro-gusa, o aumento de 1% na produção de ligas metálicas demandaria, aproximadamente, 46 e 53 mil m³ de madeira, considerando os cenários altamente (RG = 30%) e pouco (RG = 26%) tecnificados, respectivamente, para suprir o aumento. Em área plantada, o aumento na participação do carvão vegetal demandaria 182 e 210 hectares de floresta anualmente, respectivamente. No total, a demanda anual por florestas de eucalipto com 7 anos de idade seria de 6.395 hectares apenas por estes segmentos industriais.

Neste contexto, no estado de Minas Gerais, onde encontra-se o maior parque siderúrgico do mundo, também concentra a maior área plantada de eucalipto do país, correspondendo a aproximadamente 1,37 milhões de hectares (≈24%) (IBÁ, 2019), 46,4% são destinados à produção de carvão vegetal. Dessa forma, com a transição energética mundial e as ações firmadas pelo Brasil no acordo de Paris (COP-21), os setores siderúrgicos e metalúrgicos deverão estar preparados em virtude do ciclo de produção florestal.

O planejamento florestal terá papel importante no cenário de transição energética no Brasil, vale ressaltar a importância de melhoria da produtividade das florestas plantadas, eficiência de conversão da madeira em carvão vegetal e redução do consumo específico de carvão vegetal pelo setor, o que está associada à melhoria da qualidade do carvão vegetal. Neste sentido, o GT Ferroligas busca contribuir juntamente com as empresas no planejamento florestal e a atender as exigências de qualidade do carvão vegetal para fins metalúrgicos, bem como a busca por maior produtividade florestal através do cultivo de materiais genéticos que melhor se adaptam a cada região.

 

Referências

 CGEE – Centro de Gestão e Estudo Estratégico. Modernização da produção de carvão vegetal no Brasil: Subsídio para revisão do plano siderurgia. Brasília – DF, 2015. 150p.

EPE – Empresa de Pesquisas Energéticas; Balanço Energético Nacional 2019, ano base 2018; Rio de Janeiro: EPE, 2019, 292p.

IBÁ – Indústria Brasileira de Árvores; Relatório 2019, ano base: 2018. Brasília – DF; 2019, 80p.

SFB – Serviço Florestal Brasileiro; Florestas do Brasil em resumo: 2019. Brasilia – DF. 2019. 207p.

SINDIFER – Sindicato da Indústria de Ferro no Estado de Minas Gerais. Anuário Estatístico 2020 – ano base 2019. Belo Horizonte – MG, 2020. 26p.

 

Humberto Fauller de Siqueira

Engenheiro Florestal

Coordenador Operacional do GT Ferroligas